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Foto do escritorProfessores na Quarentena

O outro lado da Pandemia (José Predebon)

José Predebon, Maio, 2020


Hoje, 04 de Maio de 2020, raros habitantes deste planeta não estão preocupados e ocupados com um só assunto: covid-19.

Somos vítimas da pandemia, e há milhares de mortos. Mas eu, sinceramente, creio que esse problema contém nele próprio sua solução, e que precisamos lutar para descobri-la.

Penso assim, não só por tentar manter um olhar positivo para a incerteza que assusta o mundo, mas por me inspirar em David Bohm, cientista ganhador do Nobel, que nos mostrou que o caos contém uma ordem implícita. Por decorrência, cada novo problema deve trazer em si novas soluções

Realmente, neste momento isso parece se confirmar, pois já começamos a ver no noticiário como estão nascendo soluções que, se ainda não vencem o vírus e seu ciclo, surgem para sanearmos o nosso planeta que, ultimamente, se tornava quase inviável.

Antes do Covid já se temia um fim do mundo, causado pelas agressões ao meio ambiente e a consequente crise climática. Frente ao ar irrespirável e a ameaça do derretimento das calotas polares, os cientistas (e os jovens) defendiam medidas radicais enquanto o sistema resistia a qualquer mudança que pudesse diminuir os fluxos comerciais e financeiros.

Por que usar combustíveis alternativos, argumentava o poder econômico, se o petróleo ainda dará lucros por dezenas de anos? Essa ótica, pragmática e monetarista, não levava em conta os efeitos da poluição que já estão extinguindo várias espécies e causando o desaparecimento de ilhas inteiras no Pacífico.

Então ultimamente foram cortadas as verbas de pesquisas de novas fontes limpas de energia, e as medidas defendidas por cientistas e ativistas eram menosprezadas. Mas o fim da vida humana no planeta já deixava de ser apenas uma “visão histérica”.

Sabemos que nós e nossas organizações erraram demais. Mas agora, no meio do tsunami da pandemia, aleluia, começamos nos redimir. Ressurge uma atitude humana que estava relegada ao esquecimento, a solidariedade.

Esse sentimento comunitário sempre existiu, como fator biológico de autoproteção das espécies. Recentemente a ciência até localizou a zona do cérebro onde está o impulso humano de acudir o semelhante.

Aqui está uma conclusão que nasce desse raciocínio: a nova doença não irá provocar nosso fim, mas, por que não, um reinício. A sociedade começa a acordar de uma dormência provocada pelo sucesso do sistema econômico, que se disseminou no mundo inteiro graças à sua eficiência ímpar, o capitalismo.

A consciência de que o dinheiro, como representante do poder, distorce nossas vidas e nos desumaniza, vem se tornando cada vez mais presente na camada mais informada da sociedade. Nesta geração foi tema de Richard Sennet, pensador norte-americano que, por suas denúncias atacando o poder econômico, se tornou uma bandeira da esquerda.

Em sua obra, de vida inteira, Sennet defende que o capitalismo prevalece no mundo porque se baseia na competição, mas que, por ter essa motivação forte, acorda no ser humano sua parte mais feroz. E assim se torna o capitalismo selvagem, um vale tudo.

A ação de atividades capitalistas, provocando a destruição da natureza, foi bem relatada no livro em que o inventor do cartão Visa, Dee Hock, escreveu em 2001, “O Nascimento da Era Caórdica”. Hock foi um destacado agente do establishment, com uma visão inside de seus mecanismos pragmáticos.

Ao descrever em seu livro a “Aliança Caórdica”, organização sem fins lucrativos que fundou e dirige, e cujo nome vem da missão de colocar ordem em nosso caos, Hock conta como antes, nos dezessete anos em que dirigiu o cartão Visa, tornou-o a maior organização financeira do mundo, porém não conseguiu fazê-la amiga do planeta e de nossa espécie.

Rico, porém desgostoso, Hock aposentou-se, comprou terras desertificadas para passar o arado e esperar que a natureza as vivificasse de novo. Então foi convidado a fazer no terceiro setor o que tinha feito no mundo empresarial. Fez. Fundou a maior organização não comercial dos Estados Unidos, mantenedora de dezenas de ongs.

A saga desse idealista é uma história notável, que inspira a esperança de que uma atitude menos monetarista, que está nascendo agora, poderá fazer nascer um novo contrato social no mundo inteiro. A Fiat, uma das organizações gigantes do mundo, já sentiu que após a pandemia teremos novos consumidores cidadãos, e faz agora um plano tentando se antecipar.

Como estamos no fundo do poço, qualquer movimento para essa esperada mudança será uma troca de direção em nosso futuro. O covid-19 poderá estar salvando nosso planeta.

Se esse é só um sonho de minha visão otimista, o tempo dirá. Mas prefiro e aconselho: é melhor sonhar acordado do que dormir desesperançado. □□□

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